UM POUCO DA HISTÓRIA
A Igreja de Cristo foi iniciada a partir da vida (e ensinos), morte, ressurreição e ascensão de Cristo, como relatado no Novo Testamento, em especial nos Evangelhos e em Atos dos Apóstolos. Desenvolveu-se a partir do ministério do Espírito Santo, que usou para isso pessoas como os apóstolos e discípulos de Cristo, especialmente Pedro e Paulo. No entanto, com o passar do tempo, esta igreja primitiva foi se desviando da visão e práticas iniciais, e logo estava fora da rota, envolvidas em doutrinas e práticas erradas. Vários cristãos verdadeiros surgiram, em cada fase da história da igreja, tentando alertar contra este engano, mas só a partir dos reformadores, e especialmente com Lutero no início do século XVI, iniciou-se o retorno à visão da igreja original.
A Reforma colocou novamente em pauta: a Bíblia como autoridade máxima em matéria de fé e prática, a justificação pela fé e o sacerdócio de todos os crentes. Os primeiros organizadores da Igreja Menonita, Conrad Grebel na Suíça e Menon Simons na Holanda, frisaram a Verdade e o Espírito como características fundamentais da Igreja baseada no Novo Testamento.
Da Reforma do século XVI, desenvolveram-se quatro grandes ramos da Igreja. A Igreja da Inglaterra conservou muitos das formas exteriores e do ritual da Igreja Romana, ao mesmo tempo que desenvolveu a doutrina bíblica da salvação pela graça por meio da fé. Os luteranos da Alemanha e dos países escandinavos alongaram-se mais no seu programa de reforma, dando maior ênfase à justificação pela fé e separando-se completamente de Roma. Os reformadores da Suíça, França, Holanda e Escócia (Presbiteriana) insistiram ainda mais radicalmente do que os luteranos para eliminar todas as formas romanas de adoração. Mas, coube aos anabatistas (de onde vieram os menonitas) a visão e o compromisso de obter reformas mais radicais, buscando na Igreja Apostólica os seus padrões e rejeitando inteiramente não apenas o corpo da tradição eclesiástica, mas também todo o sistema de Igreja Oficial unida com o Estado, assim como o batismo ministrado às crianças.
O ANABATISMO
O estímulo inicial ao anabatismo originou-se do reformador radical Zwinglio em Zurique - Suíça, no período que vai de 1519 a 1523. No outono de 1523, alguns de seus jovens colegas universitários, como Conrad Grebel e Felix Mantz - principiaram a sentir que Zwinglio estava olhando mais para a aprovação dos senadores de Zurique, do que seguir resolutamente as claras diretrizes da Palavra de Deus.
Grebel e seus amigos insistiram na conservação do programa original de Zwinglio, no que dizia respeito à eliminação do batismo de crianças. Eles queriam desenvolver aquele programa e estabelecer imediatamente as congregações livres de discípulos dedicados, batizados após uma confissão de fé em Jesus e que seguiam a nova vida.
Por um pouco mais de um ano, Grebel tentou em vão persuadir Zwinglio a lançar um programa do mesmo estilo do livro de Atos dos Apóstolos. Assim, Grebel iniciou o batismo dos crentes (anabatismo) em Janeiro de 1525, estabelecendo o que hoje chamamos a Igreja Menonita. O termo menonita originou-se de Menno Simons, um ex-padre católico que foi convertido e se uniu ao grupo de anabatistas holandeses em 1536. Durante vinte e cinco anos ele pastoreou as igrejas espalhadas pela Alemanha e Holanda, orientando sabiamente o movimento.
HISTÓRIA
A. Perseguição
A partir de 1525, existiam numerosas igrejas de anabatistas na Suíça e no sul da Alemanha. Eles cresceram em número muito rapidamente não apenas nessas regiões, mas também pelo noroeste da Alemanha e Holanda e, ao leste, na Áustria. A Igreja Romana, e até os luteranos e zwinglianos perseguiram-nos de um modo terrível, especialmente por sua recusa de batizarem suas crianças e pela oposição às igrejas oficiais ligadas com o Estado.
A perseguição começou imediatamente para os anabatistas e no decurso de poucos anos, milhares destes crentes sinceros pereceram queimados, afogados ou mortos à espada. A tortura foi largamente usada na quebra da vontade e obtenção de informações sobre os irmãos e suas atividades. Em geral, esta feroz perseguição foi bem sucedida na exterminação da Irmandade, mas alguns pequenos grupos conseguiram sobreviver na Suíça, Alemanha e Holanda. Completa tolerância não foi alcançada em certos países, como Suíça por exemplo, até o século XIX.
B. Influências
Em 1608, vários puritanos fugidos da Inglaterra por causa das perseguições chegaram à Holanda e entraram em contato com os menonitas. Os ingleses que foram influenciados pelo ponto de vista menonita, fundaram mais ou menos em 1612 a primeira Igreja Batista (ou Anabatista) da Inglaterra. Destes primeiros batistas ingleses procederam os demais batistas que fundaram muitas igrejas no mundo da língua inglesa. Também da raiz anabatista, podemos citar vários grupos, como os Congregacionais, Quakers, Huteristas e Amish.
Durante os séculos XVIII e XIX, milhares de menonitas, de origem suíça e holandesa, muitos deles da Rússia, para onde imigraram procurando obter completa liberdade religiosa, estabeleceram-se na América do Norte. Lá, os menonitas cresceram e há hoje aproximadamente quatrocentos mil membros.
C. Os Menonitas Hoje
Embora haja uma grande concentração de menonitas na América do Norte, há igrejas menonitas em seis continentes: África, América do Norte, América do Sul, Ásia, Austrália e Europa, resultado de imigração e da expansão missionária. Há hoje congregações menonitas em mais de 80 países como Zaire, Índia, Indonésia, Alemanha, Holanda, Brasil, Paraguai, etc. O número estimado hoje (1996) é de um milhão de cristãos menonitas em todo o mundo.
No Brasil, existe hoje basicamente três grupos menonitas, o primeiro chamado Igreja de Deus em Cristo, Menonita estabelecido em Rio Verde - GO; um segundo grupo, chamado de Associação das Igrejas (Evangélicas Irmãos) Menonitas do Brasil, estabelecidas basicamente na região Sul e São Paulo, formada basicamente por famílias de origem alemã/russa, refugiados no Brasil a partir de 1930 (e brasileiros e descendentes); Finalmente, temos a Associação Evangélica Menonita (AEM). A AEM iniciou seus trabalhos há quarenta anos, fruto do trabalho missionário menonita da América do Norte (MBM/COM).
A AEM tem, durante este período, trabalhado especialmente com evangelismo, obras de assistência social e literatura cristã. Sua sede está localizada em Campinas - SP, e contam com 30 igrejas distribuídas em 7 estados (Santa Catarina; Paraná; São Paulo; Goiás; Distrito Federal; Tocantins e Pernambuco); 3 livrarias cristãs; editora; escola de preparação teológica, além de escolas e creches. Mais recentemente está iniciando trabalho missionário em Moçambique e Angola, na África.
ALGUMAS CRENÇAS BÁSICAS
Para os menonitas, a verdade cristã é eterna e imutável. Eles aceitam toda a Bíblia como sendo a inspirada Palavra de Deus, inerrante em seus conselhos e autorizada em seus mandamentos (II Tm 3:16). O Novo Testamento é decisivo em sua autoridade sobre o Velho Testamento (Hb 8:6), e a figura de Jesus Cristo, O Verbo que se fez carne é o critério para toda a interpretação bíblica.
Para que a letra bíblica se converta em ação há necessidade de explicações e aplicações práticas na vida. Para os Menonitas a congregação é considerada como lugar onde a Bíblia pode explicar-se melhor. Quando os irmãos se reúnem para estudo e adoração e em busca de soluções de seus problemas, o Espírito Santo fala claramente à sua vida de forma viva, pessoal e atual.
Aqueles que desejam relativismo teológico não o encontrarão na Bíblia. A Igreja não pode ensinar as doutrinas dos homens como lei de Deus, nem os homens podem ignorar o que a Palavra de Deus requer deles. A mensagem da Igreja deve ser, portanto, a Palavra do Senhor sem adição ou subtração, e seus princípios contextualizados e aplicados à vida do presente século.
Como parte da família das denominações cristãs, os menonitas também dão testemunho da sua fé realçando alguns princípios, os quais acreditam ser de vital importância para a vida da Igreja. Embora hoje sejam comuns à maioria das denominações, estes pontos devem ser destacados, pois nos motiva e alerta a uma vida cristã onde a fé viva nos leva a sermos relevante como igreja, especialmente no atual momento, onde várias igrejas levam as pessoas a uma fé não produtiva.
A - TESTEMUNHO SEM RESERVA
O cristão é identificado pelo seu andar e sua confissão do nome, vontade e ensinamentos de Jesus. O batismo cristão é testemunho da entrega pessoal e sem reserva ao domínio e senhorio de Jesus Cristo. É o símbolo da fé e arrependimento do pecado, da morte para a velha vida escrava do pecado, e da ressurreição espiritual para uma nova vida em Cristo.
Esta vida é um compromisso e atitude na presença de Deus, de seguir e divulgar as boas novas de Cristo, segundo a ética do Reino de Deus. Hans Denck, um anabatista do século XVI, disse, Ninguém pode conhecer verdadeiramente a Jesus, a menos que O siga na vida. A Igreja Menonita batiza somente discípulos, adultos e responsáveis, após a confissão de fé no Senhor Jesus.
A salvação de crianças, como de todos, depende de algo mais significativo do que a aplicação da água no corpo; as crianças são salvas em seus primeiros anos, antes de atingirem a idade da justificação pessoal, pela obra universal do sacrifício de Cristo (Mt 10:14). Ele morreu para trazer vida à humanidade, da mesma maneira que Adão, com seu pecado, trouxe pecado e morte à raça humana toda (Rm 5).
B - A ÉTICA DO AMOR
O sinal de identificação do cristão é o amor, isto é, uma atitude que requer fazer o melhor para os outros, chegando mesmo ao ponto de sacrifício próprio (Jo 15:12,13). O amor é mais do que mera emoção ou sentimento, é uma decisão sincera para se fazer somente o bem ao próximo (I Co 13), significando o completo abandono da força para atingir objetivos (Mt 5:39). A função central e básica do cristão é servir como embaixador de Cristo e pregar o evangelho da reconciliação com Deus (II Co 5:18-20).
Os menonitas, portanto, adotam como ética ideal, o amor incondicional e a não-resitência àqueles que lhes façam mal. Eles consideram a providência de Deus Todo Poderoso capaz de cuidar deles e acreditam que Sua graça pode capacitá-los a suportar qualquer coisa que Deus lhes possa permitir. Insistem portanto em amar a todos os homens, amigos ou inimigos, entendendo que somente o amor pode transformar um inimigo em amigo, e isto nunca será conseguido pela força (Rm 12:20-21). Inclusive as divergências e problemas internos devem ser resolvidos no espírito de amor e perdão, como nos ensinou Jesus.
Devido ao amor que eles têm uns pelos outros, os menonitas também praticam o que eles chamam auxílio mútuo, isto é, eles auxiliam uns aos outros em todo e qualquer caso de necessidade (Gl 6:10). A ética de amor também requer a ajuda e assistência social cristã. A penúria dos necessitados e desamparados, dos desabrigados e dos marginalizados, deve despertar a compaixão de todos, em especial aos que vivem em abundância. Esta atitude de carregar as cargas uns dos outros é o cumprimento da lei de Cristo do amor ao próximo (Gl 6:2).
C - SANTIDADE E FRATERNIDADE
No sermão da montanha (Mt 5-7), Jesus não somente proibiu que seus seguidores usassem a força na realização de seus alvos (Mt 5:38-48), como também ensinou-lhes a usar apenas a linguagem construtiva (Fp 4:8) e em verdade (Tg 5:12).
Observando-se o fato de que a Igreja é formada de irmãos e irmãs no Senhor, seria impróprio de tal grupo formar qualquer espécie de facção, que possua certas informações ou planos secretos. Os menonitas, portanto, se opõem a todos os juramentos restritos de fraternidades e sociedades secretas. Realmente, algumas destas fraternidades não se definem como, mas efetivamente são religiões, e a Maçonaria, Rosa Cruzes são exemplos.
Além de uma vida com relacionamento vertical, isto é, somente em relação com Deus com pouca ou nenhuma direção do grupo, os menonitas praticam um preocupação com o horizontal, ou seja com o próximo, e aceita como membro somente aqueles que compartilham a sua fé e aceita a sua disciplina. A Igreja não pode pedir mais e nem aceitar menos de seus membros do que as Escrituras ensinam. A fraternidade da Igreja não pode aceitar apenas palavra mas também santidade e fé pessoal com bom testemunho de fé viva (Tg 1:22). Isto não exclui os novos da fé do corpo de Cristo, mas antes impede de pertencerem à Igreja aqueles que querem ser apenas membros da igreja, sem tomar as responsabilidades da vida cristã (Mt 7:21).
Como a Igreja de Cristo deve ser uma fraternidade, nenhuma distinção baseada em qualquer fator terreno deve ser enfatizada(Gl 3:26-28). Nem riquezas, nem cultura, nem ordenação devem embaçar a verdade do sacerdócio universal dos santos. Conseqüentemente, os ministros são considerados, basicamente, mestres da Palavra de Deus mas toda ênfase em títulos devem ser evitada devido ao caráter de fraternidade da Igreja (Mt 23:8-12), sendo todos os membros considerados, uns pelos outros, irmãos e irmãs no Senhor (I Co 12:12-27).
D - A COMUNIDADE VOLUNTÁRIA
A Igreja do Novo Testamento é uma comunidade voluntária. É composta de pessoas que, por decisão própria, renunciam todo o procedimento do mal e rendem suas vidas em obediência ao domínio e senhorio de Jesus Cristo. A vida comum na Igreja consiste na adoração e no viver de Seus ensinamentos. E, a ética do amor de Jesus rege as relações fraternais.
Esta Igreja, sendo uma comunidade voluntária sob o senhorio de Jesus, é diferente e separada do estado. No Estado, todos ingressam-se, como cidadãos pelo nascimento natural enquanto que, na Igreja, é necessário nascer de novo no espírito; o Estado inclui todos, enquanto que a Igreja é formada apenas pelos discípulos de Jesus Cristo. O Estado é controlado pela lei dos homens, enquanto a Igreja o é pela Palavra de Deus (II Pe 3:2); O Estado tem um chefe humano e a Igreja um chefe divino, que é Cristo (Cl 1:18); as sanções do Estado incluem a perda de propriedade, da liberdade e até da própria vida, ao passo que a sanção mais severa da Igreja é a excomunhão (II Ts 3:6). Resumindo, a função do Estado é a conservação e aplicação da lei e da ordem, e a tarefa da Igreja é a evangelização do mundo (Mt 28:19,20). Embora em várias situações pode haver parceria, uma instituição deve respeitar a especificidade e o trabalho da outra.
E - DISCIPULOS DE JESUS
A vida do discípulo de Jesus envolve a negação de si mesmo para a causa de Cristo, assim como uma simplicidade de vida (Lc 9:23-24). O egoísmo, o luxo e a ostentação do rico não podem ser praticados por aqueles que se dizem seguidores verdadeiros do humilde Salvador (Lc 12:22-31), e a obediência a Cristo e santidade pessoal devem caracterizar sempre os crentes (I Pe 2:9-12). A riqueza que se possui não deve ser encarada como propriedade que se tem, mas como uma dádiva de Deus para ser usada em Sua honra, para a obra de Sua Igreja (I Tm 6:17-19).
Assim observam a verdade Bíblica de que o homem e a mulher são iguais diante de Deus, com dignidade e responsabilidades específicas. O matrimônio é sagrado e para toda a vida, sendo os atuais fracassos resultados do pecado, necessitando da reconciliação cristã em amor. Portanto consideram como pecado o separar de seu cônjuge e casar-se com outro.
Os discípulos de Jesus não vivem sua vida cristã isoladamente, mas com boas relações com todos os outros discípulos. Eles aceitam reciprocamente a responsabilidade da prática da disciplina e ajuda mútuas. São unidos e comprometidos em seguir os ensinamentos de Jesus em amor fraternal, e não abandonam nem desprezam aqueles por ofensas e pecados, mas buscam a sua reconciliação nos padrões bíblicos. A disciplina é vista como amar um ao outro e a sua prática é realizada dentro da congregação conforme o ensino de Jesus em Mt 18:15-20.
UM RESUMO
Podemos resumir os princípios do anabatismo em 7 itens básicos:
i - Somente as Escrituras (como autoridade e regra de fé e prática); ii - Pelo poder do Espírito (a congregação local, com a ajuda do Espírito Santo deve interpretar a Bíblia);
iii - Seguindo a Cristo na vida (para ser cristão devemos seguir radicalmente os ensinos de Cristo);
iv - Amor (opor-se ativamente ao mal em amor, sem violência);
v - Somente crentes (adultos batizados formam a igreja, pois podem arrepender e aceitar a salvação; contra igreja Estatal e batismo infantil);
vi - A regra de Cristo - Admoestação (a disciplina na igreja deve ser exercida segundo os padrões bíblicos, especialmente Mt 18, visando vida e compromisso cristãos autênticos);
vii - Nunca sozinho (a vida cristã deve ser a de comunidade que vive física, emocional, espiritual e financeiramente em auxílio mútuo).
UM CONVITE
A Igreja Evangélica Menonita convida a todos que desejam se converter a Cristo, abandonando a vida de pecado e queiram viver para Deus, de acordo com estes princípios, que se unam a esse ramo do corpo de Cristo. Sua função não é manter bandeira denominacional, nem ficar parada na história, mas sim que a partir dos conhecimentos e experiências aprendidas com toda a história da Igreja de Cristo na terra, possamos contribuir para uma igreja cada vez mais autêntica e próspera em apresentar e auxiliar pessoas a conhecerem e crescerem espiritualmente em Cristo Jesus.
Adaptado de um artigo de J.C. Wenger e traduzido por Corina C. de Rosa em 1956
Revisado por Arlin D. Yoder em 1979
Atualizado por Antônio Carlos Faria em 1996